Seis meses após a maior mortandade de peixes já registrada no Rio Piracicaba, pescadores da Área de Proteção Ambiental (APA) do Tanquã, em Piracicaba (SP), continuam enfrentando sérias dificuldades para se sustentar. O desastre ambiental, que resultou na morte de mais de 253 mil peixes, afetou profundamente a atividade pesqueira da região e gerou uma série de medidas emergenciais para tentar minimizar os danos.
Carlos César Giacomini Bernal, proprietário de um bar na vila dos pescadores, celebra a volta de alguns turistas ao local, conhecido como o minipantanal paulista. “Agora, graças a Deus, estão voltando. De uns dois meses para cá, graças a Deus tá bom”, afirma. No entanto, ele e outros pescadores ainda enfrentam desafios financeiros. Segundo Bernal, o seguro defeso, um auxílio de um salário mínimo pago pelo governo federal durante o período de proibição da pesca, ainda não foi depositado. “Até agora ninguém recebeu nada. A pesca fecha em dezembro. Era para receber dezembro, janeiro, fevereiro, o mês certinho”, relatou.
A prefeitura de Piracicaba, que distribuiu cestas básicas aos moradores afetados pela tragédia, encerrou o auxílio em dezembro de 2024. Nilson Abraão, o Alemão, um dos pescadores da região, relatou que sentiu falta da cesta, que ajudava a suprir a necessidade de itens básicos. “Faz falta a cesta, porque a gente contava com ela. As coisas que vinha na cesta básica a gente já não precisava comprar”, disse.
Diante da escassez de recursos, muitos pescadores buscaram outras formas de sustento. Alemão contou que passou a realizar trabalhos temporários, como carpir, colher laranja e limpar ranchos para sobreviver. “Na maioria das vezes, a gente limpa rancho para os outros. Porque ficar parado não dá, né?”, afirmou.
Outra medida de apoio foi o crédito emergencial para financiamento, oferecido pelo estado com juros reduzidos. Lucas Veronez Caetano, pescador da região, conseguiu acessar o crédito, mas recebeu menos da metade do limite de R$ 25 mil. “A gente ficou parado depois do acontecido e ajudou a pagar a conta de casa, se mantendo”, afirmou. No entanto, ele também teve que procurar alternativas para garantir a sobrevivência. “A gente está trabalhando de outras formas, fazendo bico aqui, outro ali, para se manter”, disse.
A nova administração de Piracicaba informou que as famílias em situação de vulnerabilidade podem procurar o Centro de Referência em Assistência Social (Cras) Novo Horizonte para pedir novamente o benefício das cestas básicas. Os pedidos serão analisados individualmente.
A tragédia ambiental no Tanquã teve início em julho de 2024, quando cerca de 253 mil peixes morreram devido à poluição no Rio Piracicaba, causada por um vazamento de substâncias químicas da Usina São José, em Rio das Pedras (SP). A empresa foi multada em R$ 18 milhões pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), mas ainda contesta a responsabilidade pelo ocorrido. A poluição causou a queda do nível de oxigênio no rio, o que impossibilitou a sobrevivência dos peixes e afetou toda a fauna e flora da região.
O impacto da tragédia foi devastador. Em um trecho de 70 quilômetros do rio, as análises da CETESB confirmaram um nível de oxigênio próximo de zero, o que resultou na morte de pelo menos 50 toneladas de peixes. A área afetada, equivalente a 14 mil campos de futebol, abriga mais de 735 espécies de animais e centenas de plantas. A recuperação do ecossistema pode levar até nove anos, segundo analistas ambientais.
Como parte dos esforços para repovoar o Rio Piracicaba, a prefeitura de Piracicaba soltou 95 mil alevinos (peixes recém-nascidos) na região do Tanquã em outubro de 2024. No entanto, a recuperação da biodiversidade local e a estabilidade da atividade pesqueira ainda exigem tempo e apoio contínuo para os pescadores.
O Ministério da Pesca e Agricultura foi questionado sobre a demora no pagamento do seguro defeso, mas não houve resposta até a última atualização desta reportagem. A luta dos pescadores do Tanquã continua, com a esperança de que, aos poucos, a região se recupere dos danos ambientais e que a assistência pública seja mais ágil para garantir a sobrevivência das famílias afetadas.